Crítica
O que há de mais anormal a não ser a normalidade?
Por Jader Galam Ruivo | 28/02/2024
Minha nota:
A Alemanha Nazista no comando de Adolf Hitler executou aproximadamente mais de 1 milhão de crianças, 2 milhões de mulheres e 3 milhões de homens judeus, ciganos, gays, pretos entre outras minorias de 1939 até 1945. Amplamente considerada uma das maiores tragédias da história da humanidade, e definitivamente a maior do século XX, o Holocausto é retratado constantemente até os dias atuais em filmes, livros, séries, documentários e qualquer outro meio midiático. E é a base dessa atrocidade que Zona de Interesse narra tua história.
O ano é 1943, Rudolf Höss, comandante do campo de concentração de Auschwitz, mora com sua esposa e seus 5 filhos em uma casa literalmente do lado do campo. Rudolf tem um dia a dia simples, vai “trabalhar”, volta pra casa, vai levar os filhos para passear, fica em casa com a esposa, uma normalidade estranhamente anormal. Enquanto tudo isso acontece no dia a dia da família Höss, do outro lado do muro escutamos gritos, fornalhas, tiros e sons de trens.
Esse é apenas um plano inicial do que consiste Zona de Interesse, filme dirigido por Jonathan Glazer indicado à 5 Oscars, inclusive o de Melhor Filme. Tem algumas semanas que leio frequentemente sobre o filme, e meu interesse só aumentava mas eu sempre tive uma certa rivalidade com filmes sobre o Holocausto, desde A Lista de Schindler até O Menino do Pijama Listrado, não porque eu achasse ruim, mas sim porque é sensível demais pra mim, é o típico filme que vejo uma vez e nunca mais. É difícil citar temática mais importante do que essa, até porque precisamos reforçar a história para não estarmos fadados a repeti-la.
Por mais que seja importante demais essa temática para os dias atuais, conduzir a trama pelo ponto de vista dos nazistas exige muito cuidado para não cair na romantização ou até mesmo a humanização dessas pessoas. Ao humanizar essas pessoas, a normalização de tudo aquilo vem à tona, e eu juro que se antes de ver o filme me perguntassem se existe alguma forma de fazer um roteiro com a normalização e humanização dos nazistas ser aceitável, eu com certeza diria que é impossível. Mas é exatamente nesse ponto que o roteiro de Jonathan Glazer, adaptando o livro homônimo de Martin Amis, é genial. Ele consegue humanizar aquela família e tornar tudo aquilo normal, e é exatamente isso que faz com que nos dê ânsia de vômito ao assistir tudo aquilo. Tem uma cena em específico que do lado de fora da casa, Hedwig, a esposa de Rudolf, mostra o jardim para tua mãe que está a visitando, flores lindas, cheirosas, um ar gostoso, tudo bem verde e vivo, enquanto ao fundo você consegue ouvir os gritos de alguém agonizando de dor, uma fumaça saindo de uma chaminé e barulhos de tiros, e tudo aquilo é super normal para aquela família, a banalização do mal me dá vontade de vomitar. Momentos depois, Hedwig experimenta um luxuoso casaco de pele retirado de uma prisioneira judia recém-chegada em Auschwitz, e ela não está nem ai para a origem, à quem pertencia ou ao menos o que vai acontecer com a mulher dona daquele casaco, e de quebra ela manda costurarem os furos que tinham no casaco.
A direção de Jonathan Glazer é espetacular, em momento algum ele nos deixa criar algum tipo de empatia com aquela família, e também nunca nos deixa esquecer do que está acontecendo naquele lugar. Câmera sem movimentos e mise-en-scène perfeita com claustrofobia enjaulada naqueles planos fechados, uma noite silenciosa mas que grita muito e um mix do belo e do horror estampado na nossa cara. A fumaça sempre está saindo da chaminé no fundo dos planos e ao mesmo tempo temos crianças brincando no jardim da casa, e aquilo é a mais pura frieza da indiferença.
O elenco é muito bom, Christian Friedel interpreta aquele comandante de Auschwitz com a maior frieza possível, sempre com um olhar fundo e pouca cara de preocupação, porém, sempre sério demais. Sandra Hüller está maravilhosa, e que ano para essa atriz que faz dobradinha no Oscar junto de Anatomia de Uma Queda, ela poderia estar facilmente indicada para Melhor Atriz Coadjuvante, para mim ela consegue ser a mais fria daquele lugar, até mesmo mais que teu marido, me dá uma repulsa apenas de olhar para a cara de sua personagem. O elenco de base também está muito bom, todos cumprindo teu papel perfeitamente.
A trilha sonora composta por Mica Levi é incômoda, e abre o filme com uma tela preta de vários minutos enquanto ouvimos os sons do campo de concentração. Ela é mais ausente do que presente, mas quando ela surge aos nossos ouvidos é quase impossível ficar sem se mexer na cadeira, e a música dos créditos finais creio que seja o mais próximo da trilha sonora do inferno.
Zona de Interesse foi citado por Steven Spielberg como “o melhor filme sobre o Holocausto desde A Lista de Schindler”, e eu não poderia concordar mais. É triste, delicado, sofrido e muito mas muito doloroso. Mantendo o ritmo durante suas quase 1h50m, o longa faz o serviço de não nos deixar esquecer o que aconteceu ontem na história da humanidade. Eu digo com certeza que é o filme mais delicado e importante desta temporada, afinal, que tecemos lembranças do passado, para que a sabedoria floresça e os erros não se repitam ao longo desta jornada.
Simplesmente incrível! Uma escrita excelente e muito rica em detalhes. O filme dispensa comentários. Parabéns pelo trabalho!
Cara eu nunca assisti esse filme
Cara
Um Filme completamente assustador, mesmo não sendo de terror, ele nos trás o medo do que a humanidade fez, e o que pode fazer. Muito bem executado pelo diretor
Exatamente, filmasso.